terça-feira, 24 de novembro de 2009

Ahmadinejad: manifestante gay consegue driblar segurança

Rodrigo Range da Agencia Estado

BRASÍLIA - Num de seus últimos compromissos oficiais em Brasília, o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, assistiu ao protesto solitário e silencioso de um integrante de um grupo gay de Brasília. A menos de cinco metros de Ahmadinejad, Júlio Cardia, 25 anos, conseguiu erguer um cartaz e a bandeira do movimento gay.

O protesto se deu na sala onde Ahmadinejad concedia entrevista coletiva, no hotel em que estava hospedado, um dos mais luxuosos da cidade. Cardia conseguiu driblar a segurança, sentou-se no fundo da sala e, quando a entrevista já estava perto de terminar, levantou o cartaz, que foi prontamente arrancado de suas mãos pelos agentes iranianos. Em seguida, ele desfraldou a bandeira do arco-íris. Foi retirado da sala na sequência.

Funcionário de uma empresa de serviços em Brasília, Cardia faltou ao trabalho nesta segunda-feira, 23, só para acompanhar os passos de Ahmadinejad na cidade. Semanas antes, ele se juntara a representantes das comunidades judaica e baha’i para organizar os protestos. Juntos, conseguiram mobilizar cerca de 200 pessoas, mas nenhum deles chegara tão perto do líder iraniano.

"Não aceitamos que pessoas como nós, gays, estejam sendo esquartejadas no Irã", disse Cardia, já do lado de fora. O cartaz que ele carregava trazia a inscrição "Pela vida dos gays, contra Ahmadinejad". Cardia afirmou que seu grupo pretendia realizar um protesto maior na faculdade particular onde, horas antes, Ahmadinejad teria um encontro com estudantes. O encontro foi cancelado de última hora depois de as autoridades brasileiras alertarem a segurança do presidente iraniano sobre a vulnerabilidade do lugar.

Pouco antes da manifestação, Ahmadinejad respondera à pergunta de um repórter sobre os protestos dos homossexuais à sua presença no Brasil. Sem entrar em detalhes nem repetir sua convicção de que o homossexualismo põe em risco o futuro da humanidade, ele tergiversou: "Nós achamos que as pessoas estão livres para expressar suas ideias. No Brasil existe essa liberdade, e no Irã também".

Em outra questão afeta aos direitos humanos, o presidente iraniano se eximiu de responsabilidade pela prisão de três americanos que ultrapassaram a fronteira do Iraque com o Irã e seguem presos por ordem de Teerã. Disse que a decisão de libertá-los ou não cabe ao Judiciário. "Cada país tem seus regulamentos", declarou. Os americanos estão presos sob suspeita de espionagem. Ahmadinejad negou que sua declaração, pronunciada mais cedo no Itamaraty, de que o Irã está pronto para ampliar a produção de urânio enriquecido, seja uma ameaça aos governos do Ocidente que condenam o projeto atômico do Irã.

"Não tem nenhuma ameaça, foi uma notícia só", afirmou. Ele defendeu que países como Irã e Brasil tenham liberdade para desenvolver projetos nucleares para fins pacíficos e, sem avançar sobre o tema, admitiu a possibilidade de um acordo com o Brasil nesse setor. Indagado pelo Estado se o Irã estaria preparado para um eventual ataque militar dos Estados Unidos ou de Israel, Ahmadinejad disse, enfático: "Eles não têm coragem de praticar isso". "Nós achamos que a era dos ataques militares já chegou ao seu fim.

Hoje já é tempo de diálogo. Armas e ameaças pertencem ao passado, até para as pessoas atrasadas mentalmente, aquelas a que você se referiu (EUA e Israel)", afirmou. Dias após o presidente Lula receber o presidente de Israel, Shimon Peres, e o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, e ambos terem responsabilidade o grupo radical palestino Hamas pela escalada de violência na região, Ahmadinejad defendeu a unidade na Palestina.

"Temos relações com o governo do presidente Abbas e também com o Hamas, que têm embaixadores no Irã, e estamos interessados em que a Palestina seja unida e resolva suas questões através do consenso", disse.

O presidente iraniano disse ser a favor de um referendo para que "cristãos, judeus e muçulmanos decidam sobre seu destino", acrescentando que bombardeios ou mesmo consensos políticos não são capazes de resolver o problema.

De raspão, Ahmadinejad voltou a tocar num tema que custou caro a sua imagem nos últimos tempos. Disse que os palestinos não foram responsáveis pelo que se define como Holocausto e que, por isso, não podem pagar sozinhos "por um crime que foi cometido na Europa". Ele disse que, a partir de agora, o assunto da Palestina passa a fazer parte da agenda bilateral do Irã com o Brasil.

Referências

ESTADÃO. Ahmadinejad: manifestante gay consegue driblar segurança. RANGE, Rodrigo: 24/11/2009. Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,ahmadinejad-manifestante-gay-consegue-driblar-seguranca,470962,0.htm. Acesso em: 24/11/09

Nenhum comentário:

Postar um comentário